Com base na colaboração premiada de Lessa, a PF afirma que a denúncia anônima pode ter sido fabricada durante a desmobilização das investigações pela equipe de investigação.
ITALO NOGUEIRARIO DE JANEIRO, RJ (FOLHAPRESS) – Recentemente, a Polícia Federal divulgou detalhes sobre a investigação da morte da vereadora Marielle Franco (PSOL) e do motorista Anderson Gomes, levantando dúvidas sobre a denúncia anônima que deu início às investigações contra os ex-PMs Ronnie Lessa e Élcio Queiroz, os quais foram presos em março de 2019 sob a acusação de estarem envolvidos no crime. A denúncia anônima chamou a atenção das autoridades por não conter informações detalhadas que pudessem dar início às apurações.
Uma informação anônima pode ser crucial para desvendar crimes, como no caso da morte de Marielle Franco. A delação anônima nem sempre é vista com bons olhos, mas pode ser a única maneira de obtenção de informações em certas circunstâncias. Portanto, é essencial que as autoridades valorizem e investiguem devidamente qualquer denúncia anônima que possa colaborar com os trabalhos policiais.
Colaboração premiada e denúncia anônima
Com base na colaboração premiada de Lessa, a PF afirma que a denúncia anônima pode ter sido ‘fabricada’ num momento em que o então chefe da Polícia Civil, Rivaldo Barbosa, comunicou aos irmãos Chiquinho e Domingos Brazão que havia perdido o controle sobre a investigação. Os irmãos Brazão foram presos sob suspeita de encomendar a morte da vereadora.
Rivaldo está detido por, segundo a PF, ter auxiliado no planejamento do homicídio e na obstrução da investigação. Giniton Lages, responsável pela primeira fase do inquérito, foi alvo de busca e apreensão e indiciado sob suspeita de ter retardado propositalmente a apuração. Todos eles negam envolvimento no crime.
Giniton sempre apontou a denúncia anônima como um divisor de águas na investigação sobre os autores do crime. Ela foi registrada na Divisão de Homicídios (DH) em 15 de outubro de 2018, sete meses após a morte de Marielle e Anderson.
De acordo com documento sobre ela que consta no inquérito do caso, uma pessoa ligou para o telefone da unidade entre 11h e 12h daquele dia e contou detalhes do crime.Em relação aos autores do homicídio, o informante disse que um ex-PM conhecido como Lessa era o autor do crime.
Relatou ainda que outro envolvido era ‘um bombeiro militar’.A PF identificou, neste ponto, uma contradição entre o relato documentado da denúncia, feita por um agente da DH, e o primeiro encaminhamento dado por Giniton à informação.Ao encaminhar a informação para o setor de inteligência, o delegado pediu, escrito à mão, uma pesquisa tendo como parâmetros ‘Lessa’ e ‘Maxuel’.
Denúncia anônima e colaboração premiada na investigação
O segundo nome, porém, não consta da denúncia. Maxwell Simões Corrêa foi, posteriormente, acusado de ter conseguido e depois se desfeito do carro para a execução do crime.A denúncia anônima também atribui ao ex-vereador Marcelo Siciliano a ordem para o crime. De acordo com a PF, tratava-se de uma nova tentativa de tirar a família Brazão do alvo.
Ele já havia sido apontado como mandante por uma testemunha falsa plantada um mês após o crime.’Tais características denotam a suposta fabricação da denúncia anônima à tese já engendrada pela equipe de investigação da DHC [Divisão de Homicídios da Capital]’, diz a PF.A PF afirma também que a chegada da denúncia anônima coincide com período em que, segundo Lessa, Rivaldo Barbosa afirmou aos irmãos Brazão que não poderia mais obstruir as investigações.
A informação, segundo o ex-PM, foi repassada pelos supostos mandantes a Edmilson de Oliveira, o Macalé, ponto de contato entre eles.’Eles [irmãos Brazão] dizendo que estavam revoltados da vida, estavam incorporados porque o Rivaldo estava pulando fora. O Rivaldo virou as costas. E o Rivaldo alegou que não tinha mais como segurar.
Fugiu da alçada dele, e não tinha mais como segurar’, disse Lessa.A denúncia anônima também indicava que o carro usado no crime partiu do quebra-mar da Barra da Tijuca, informação que a Polícia Civil ainda não tinha.Giniton afirmou à Justiça, durante a instrução da ação penal contra Lessa e Queiroz, que a informação fez com que a equipe revisse imagens recolhidas dias após o homicídio.
Ao reexaminar as imagens, localizaram o Cobalt usado no crime.O delegado afirmou que o veículo não havia sido identificado antes porque agentes da DH haviam usado um programa incompatível com o arquivo do vídeo, o que reduziu sua resolução.
Ao usar a ferramenta correta, foi possível identificar a passagem do Cobalt utilizado no crime.’A equipe cometeu o maior pecado de uma investigação, que foi chegar até o quebra-mar e não seguir para trás. Acreditou demais em sua própria ‘expertise’. Quando levaram a imagem para análise, tinham que ter a certeza que o carro não passou.
Eles não perceberam um defeito de Codec [programas utilizados para codificar e decodificar arquivos de mídia] naquela imagem’, declarou o delegado.A PF aponta suspeitas sobre a justificativa.
Desmobilização das investigações e denúncia anônima
Afirma que seria necessário uma sequência de erros para que os agentes, ao analisarem os vídeos na primeira vez, não percebessem a inadequação da plataforma usada para ver as imagens.’Causa estranheza observar que […] eventos considerados improváveis se alinharam de forma harmônica, possibilitando a execução de um vídeo com falhas imperceptíveis, a ponto de não serem reportadas à sua supervisão a tempo de reparo, acarretando, assim, imenso prejuízo à elucidação do crime objeto da investigação’, afirma o relatório.
A denúncia anônima sempre foi apontada por Giniton como peça-chave para a identificação dos autores.
Em entrevistas sobre a investigação, ele atribuiu a chegada da informação ao fato de ter chamado para depor muitos matadores de aluguel conhecidos do submundo do crime, mas livres por falta de provas.’A partir desse aperto que demos nos nichos criminosos, entraram várias denúncias’, disse ele ao podcast Inteligência.De acordo com o inquérito sobre os executores, houve 190 denúncias anônimas entre março e agosto de 2018.
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Fonte: © Notícias ao Minuto
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